segunda-feira, 27 de abril de 2009

Acerto de contas, por Ana Lucia Santos

Exercício com as palavras trevas, amêndoas, etc.
Por Ana Lucia Santos

ACERTO DE CONTAS

Matheus teve uma infância tranqüila, como tantas outras crianças crescidas em cidades pequenas. Pelo menos esse era o seu ponto de vista. Não havia grandes problemas sob o olhar do menino. Brincava pelos pomares da grande fazenda, próximos da também grande casa, de onde entrava e saía livremente.

Sabia que os pais eram apenas empregados no local, mas isto não o impedia de brincar entre as jabuticabeiras que cresciam bem cultivadas. Tinham as marcas das mãos do pai e de outros empregados. Foi lá, na frente da casa grande, onde enormes samambaias pendiam de xaxins, em frente a essas mesmas samambaias “testemunhas”, que seus pais foram enxotados, da noite para o dia, quando acusados de ladrões pelos patrões. Acusaram propriamente o pai, de ter roubado todo o dinheiro destinado ao pagamento dos empregados. Não se sabe como, depois de apurada busca, passado algum tempo, o dinheiro foi encontrado no quarto do sr. Quirino, pai de Matheus. As palavras do patrão foram duras, ferinas, humilhantes. Seus pais saíram cabisbaixos, sua mãe chorava. A tudo o menino assistia.

No dia daquela expulsão, Matheus soube, se não apenas pressentiu, teriam ficado para trás as alegrias das festas, dos arrasta-pés que levantavam poeira, onde os adultos bebiam da boa cachaça. Onde se dançava ao som do acordeom nas festas juninas, onde se comia pinhas, amêndoas, doces de abóbora e coco.

Saíram sem nada, praticamente com a roupa do corpo. Pai, mãe e cinco filhos. Saíram à noite. Matheus olhava para trás. Primeiro via as luzes. Depois, só trevas. As mesmas trevas que nublaram os seus pensamentos durante muitos anos.

Agora, anos depois, retornava ao local.

Entre a saída e o retorno, as lembranças da dura vida dos pais, que se consumiram na luta diária, tentando ganhar o pão para o sustento dos filhos. Não podia esquecer a tristeza da mãe, a humilhação e a mágoa do pai pela injustiça que tinha sofrido pela vergonha que, para um homem de caráter, era como se tivesse sido mutilado, ou ferido de morte. O fato é que o sr. . Quirino não se reergueu mais.

Entre pequenos trabalhos, aqui e ali, o adoecimento precoce. Pneumonia, os médicos disseram, seguida de tuberculose. Resistiu poucos anos após a grande decepção.

A mãe tomou para si o encargo de criar os filhos. Lavava roupa pra fora, trabalhava como doméstica. Seguiu carregando sua cruz. Os filhos cresceram, também seguiram em frente. Destinos previstos, anunciados, das periferias das grandes cidades. Vida comum, pobre, precária, muitos filhos, sofrimento.

Matheus, o terceiro filho, guardava na memória os dissabores do pai. Concentrou-se neles, jurou para si mesmo vingar-se. E agora era chegada a hora.

Olhando o pêndulo do relógio na parede da grande sala, ela já não lhe parecia tão grande. Nem a sala nem o relógio. Talvez o fosse, aos olhos de um menino pequeno. O olhar agora era do homem.

Mas a casa, de fato, era de pessoas ricas.

Anunciou sua presença, se denominou representante comercial, novos insumos para a lavoura, melhor produtividade, maiores lucros. Novas perspectivas.

Logo apareceu o sr. Evaristo. Homem alto, branco, barriga proeminente, bigodes e lábios grossos, olhos claros e pele avermelhada.

Matheus olhou direto nos olhos do dono da grande casa, que logo lhe perguntava o que de novo trazia. Teria amostras grátis que garantissem a eficiência dos novos insumos para a lavoura?

Matheus manteve os olhos firmes nos olhos claros do homem. Por um lapso de tempo, se perguntou o que fazia ali. A resposta lhe veio imediata. Talvez fosse um sentimento de vingança o que impulsionava o outrora garoto e agora homem a voltar àquele lugar. Ou talvez um senso de justiça, o que o levou a levantar a arma que estava em sua mão e a apontar firmemente na direção do ex-patrão de seu pai. Em qualquer das hipóteses quanto às causas, o resultado final seria o mesmo.

Tudo se transformaria daqui pra frente, seria como a chegada do apocalipse em sua vida. Apocalipse tantas vezes invocado pela mãe quando pegava a bíblia e falava do final dos tempos. Matheus não sabia se seria ao mesmo tempo para todos o final dos tempos. Sabia sim, que para o sr. Evaristo seria agora. Para ele, talvez um pouco depois.

Com esse pensamento e a arma apontada, falou: - Trago amostras grátis sim e vendo justiça. Sou o filho do sr. Quirino, aquele homem com a vida de quem o senhor acabou quando o escorraçou daqui há quase quinze anos. Trago de graça também uma informação. Ele era inocente, o sr. sabia?

Para sua surpresa, o dono da fazenda, com olhos arregalados e perplexos, acenou afirmativamente com a cabeça.

Matheus não entendeu o gesto. Veio um lapso de dúvida. Dizia agora que sabia da inocência do pai para poupar a própria vida? Ou sabia mesmo e ainda assim o havia expulsado daquele jeito? Não importa. Também agora, em qualquer das hipóteses, o resultado seria o mesmo.

Mirou bem a pontaria e atirou. Uma, duas, três vezes. Virou as costas e saiu.

Não olhou para trás, não quis. Teve mede de ver novamente as trevas que se sobreporiam às luzes, à distância.

Não viu quando, aos gritos, vieram socorrer o sr. Evaristo. Inutilmente, ele já caído inerte. A vida se esvaindo.

Matheus, à distância, se perguntava se o homem de fato sabia da inocência do pai. Pensava que trama teriam armado para imputar a culpa a um empregado tão dedicado e honesto como sr. Quirino.

Teve raiva. O maldito do ex-patrão lhe deixara essa dúvida. E a dívida. Agora não tinha mais como cobrar.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Exemplo de crônica: Diamante Negro, de Eliana Pace

DIAMANTE NEGRO

Era uma balzaqueana, como diriam meus avós, sensual até mesmo em seu excesso de peso, os cabelos loiros à custa de muita tintura. Ninguém sabia bem o que fazia, como e onde. Devia viver só. De seu apartamento não saiam risos de crianças, broncas de marido, cantorias de empregadas.

Não tinha hora para sair ou entrar. Quando nos encontrávamos no hall do elevador, bem raramente, diga-se de passagem, nos cumprimentávamos amavelmente. - Bom dia, que belo sol, não? - Boa tarde, que chuva...

Não lembro de tê-la visto nas reuniões de condomínio, nem no supermercado do bairro, nem na farmácia da esquina. Nunca bateu na minha porta para pedir uma xícara de açúcar ou para usar o telefone. Se não fosse seu tipo espalhafatoso, eu diria que era uma mulher muito, muito discreta.

Uma manhã, ao acompanhar meu marido até o elevador, notamos uma atitude estranha no apartamento ao lado. Foi só abrirmos a nossa porta para a dela se fechar subitamente. Olhamo-nos intrigados, nos despedimos com carinho, ele tomou o elevador e eu entrei.

Três ou quatro dias depois, a situação se repetiu. E uma vez mais, e outra e outra. Percebemos então que o horário coincidia - a porta dela se fechava abruptamente às 8 horas em ponto, no momento em que meu marido saia de casa para o trabalho. Por mais que eu tentasse especular o que poderia estar acontecendo com a vizinha do apartamento ao lado, não conseguia. Depois daquele horário, nenhum movimento, nenhum ruído.

Quinze dias depois, saimos, o casal, para um compromisso conjunto às 8h30. Quando abrimos a porta do apartamento, não havia mais tempo para que ela entrasse ou escondesse seu segredo: o amante negro que, cabelos molhados e cheiro de lavanda, trocava com a loira robusta as últimas caricias explicitas de uma intensa noite de amor...

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Exemplo de crônica: Homem no Mar, de Rubem Braga

HOMEM NO MAR - Rubem Braga - Janeiro, 1953

De minha varanda vejo, entre árvores e telhados, o mar. Não há ninguém na praia, que resplende ao sol. O vento é nordeste, e vai tangendo, aqui e ali, no belo azul das águas, pequenas espumas que marcham alguns segundos e morrem, como bichos alegres e humildes; perto da terra a onda é verde.

Mas percebo um movimento em um ponto do mar; é um homem nadando. Ele nada a uma certa distância da praia, em braçadas pausadas e fortes; nada a favor das águas e do vento, e as pequenas espumas que nascem e somem parecem ir mais depressa do que ele. Justo: espumas são leves, não são feitas de nada, toda sua substância é água e vento e luz, e o homem tem sua carne, seus ossos, seu coração, todo seu corpo a transportar na água.

Ele usa os músculos com uma calma energia; avança. Certamente não suspeita de que um desconhecido o vê e o admira porque ele está nadando na praia deserta. Não sei de onde vem essa admiração, mas encontro nesse homem uma nobreza calma, sinto-me solidário com ele, acompanho o seu esforço solitário como se ele estivesse cumprindo uma bela missão. Já nadou em minha presença uns trezentos metros; antes, não sei; duas vezes o perdi de vista, quando ele passou atrás das árvores, mas esperei com toda confiança que reaparecesse sua cabeça, e o movimento alternado de seus braços. Mais uns cinqüenta metros, e o perderei de vista, pois um telhado a esconderá. Que ele nade bem esses cinqüenta ou sessenta metros; isto me parece importante; é preciso que conserve a mesma batida de sua braçada, e que eu o veja desaparecer assim como o vi aparecer, no mesmo rumo, no mesmo ritmo, forte, lento, sereno. Será perfeito; a imagem desse homem me faz bem.

É apenas a imagem de um homem, e eu não poderia saber sua idade, nem sua cor, nem os traços de sua cara. Estou solidário com ele, e espero que ele esteja comigo. Que ele atinja o telhado vermelho, e então eu poderei sair da varanda tranqüilo, pensando — "vi um homem sozinho, nadando no mar; quando o vi ele já estava nadando; acompanhei-o com atenção durante todo o tempo, e testemunho que ele nadou sempre com firmeza e correção; esperei que ele atingisse um telhado vermelho, e ele o atingiu". Agora não sou mais responsável por ele; cumpri o meu dever, e ele cumpriu o seu. Admiro-o. Não consigo saber em que reside, para mim, a grandeza de sua tarefa; ele não estava fazendo nenhum gesto a favor de alguém, nem construindo algo de útil; mas certamente fazia uma coisa bela, e a fazia de um modo puro e viril.

Não desço para ir esperá-lo na praia e lhe apertar a mão; mas dou meu silencioso apoio, minha atenção e minha estima a esse desconhecido, a esse nobre animal, a esse homem, a esse correto irmão.

Extraído do livro "A Cidade e a Roça", Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1964, pág. 11





CRÔNICA, O QUE É?

LABORATÓRIO DO ESCRITOR
AULA DE 18.04
ORIENTADORA: ELIANA PACE

CRÔNICA, O QUE É?
· Um gênero híbrido que oscila entre a literatura e o jornalismo, resultado da visão pessoal, particular, subjetiva do cronista ante um fato qualquer, colhido no noticiário do jornal ou no cotidiano.
· Normalmente destina-se à publicação em jornal ou revista mas se diferencia da notícia porque não é feita por um jornalista e sim por um escritor.
· É o acontecimento diário sob a visão criativa do escritor.
· É uma narrativa curta que geralmente tem como ponto de partida um fato real comentado pelo autor, muitas vezes de maneira lírica ou bem-humorada.
· É uma produção curta, apressada, redigida numa linguagem descompromissada, coloquial, muito próxima do leitor.
· Cronistas brasileiros notáveis: Rubem Braga, Fernando Sabino e Luís Fernando Veríssimo, entre outros

DIFERENÇAS ENTRE CONTO E CRÔNICA

A crônica pode receber um tratamento literário. Às vezes, pode ser confundida com o conto. Quando a crônica entra no terreno do imaginário, vira conto.
A crônica é o relato de um flash, de um breve momento do cotidiano de uma ou mais personagens. Uma das finalidades da crônica é justamente apresentar o fato, nu, seco e rápido, mas não concluí-lo.
No conto, as ações transcorrem num tempo maior: dias, meses, até anos, o que não se dá na crônica.
No conto, a personagem é analisada e/ou caracterizada, há maior densidade dramática e freqüentemente um conflito, resolvido em desfecho. Na crônica, geralmente não há desfecho – este fica para o leitor imaginar e, depois, tirar suas conclusões.

Tipos de Crônica: descritiva, narrativa, narrativo-descritiva, reflexiva, lírica, metalinguistica.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

A vingança do anão Sebastião

Exercício com palavras:
· Amêndoa
· Trevas
· Pêndulo
· Mágoa
· Xaxim
· Apocalipse
· Jabuticaba
· Vingança
· Arrasta-pé

A vingança do anão Sebastião
Rosi Caobianco

Perdido em seus pensamentos por uma noite sombria, vagava pelas ruas escuras à procura de sua identidade. Entre trevas e maus presságios, Sebastião, o anão, remoia um passado nada agradável. Não conseguia vislumbrar um futuro melhor.

Era o mais novo de uma família de cinco irmãos, todos de um metro e setenta e ele, um baixote franzino, enrugado de tantas injeções que tomara na vida. Tinha uma doença esquisita que o deixara abobalhado devido aos remédios tomados desde criança.

Hoje, com quase cinqüenta anos, é muito magro e, diga-se de passagem, muito feio. Deixara de crescer por causa do raquitismo da infância, passada em uma cidade do interior do nordeste, a esquecida e velha Cabrobó, no sertão de Pernambuco. Parecia o apocalipse: pobreza, fome, família enorme e doente.

Mas uma coisa, Cabrobó tinha de bom. Todo sábado lá vinha o arrasta-pé durante as quermesses. Dava até dó do povo no dia seguinte. Ficavam exaustos e de ressaca da pinga de jabuticaba vendida pelo cachaceiro, João Pinguço.

Dificilmente as moças queriam dançar com Sebastião, cujo apelido era Anão do Sertão, por não ter crescido direito. Como vingança, Sebastião ficava bêbado e incomodava a festa toda.

Sebastião convivia com a mágoa de sua fragilidade física, que em nada atrapalhava seus afazeres. Era trabalhador e esforçado. Para ajudar a família, há muitos anos fazia vasos de xaxim e vendia na rodovia. Naquele lugar não havia outra opção. As dificuldades falaram mais alto, o que dificultou a Sebastião estudar e virar doutor. De cabeça fraca, como ele mesmo dizia, não conseguira terminar nem o primário.

Às vezes, parecia um pêndulo cambaleante com seus vasos de xaxim pendurados em um cabo de vassoura às suas costas. Era deste modo que carregava suas criações todos os dias, até chegar na tenda construída de velhos entulhos recolhidos nos arredores de Cabrobó.

Sebastião gostaria de garantir uns trocados a mais, colher castanhas e comercializar amêndoas, mas o solo quase desértico não produzia quase nada por falta de irrigação.

O dinheiro que ganhava no mês dividia em casa para ajudar a criar os barrigudinhos sobrinhos que suas irmãs abandonadas trouxeram quando voltaram a viver debaixo do mesmo teto. Os maridos geralmente iam embora para São Paulo na ilusão de conseguir trabalho e nunca mais voltavam para rever as famílias que deixavam para trás. A realidade é que se deparavam com o desemprego na cidade grande por falta de qualificação.

Ô dificuldade... Mas o quê fazer? O jeito era trabalhar dobrado e se embebedar de vez em quando.

Eita vida de cão, a do anão Sebastião.

terça-feira, 7 de abril de 2009

BIOGRAFIA, POR ELIANA PACE

LABORATÓRIO DO ESCRITOR
AULA DE 04.04
ORIENTADORA: ELIANA PACE

BIOGRAFIA
é um gênero literário em que o autor narra a história da vida de uma pessoa ou de várias pessoas, mortas ou vivas.
a biografia, na maioria das vezes, refere-se à vida de pessoas públicas como políticos, cientistas, esportistas, escritores ou pessoas que, por meio de suas atividades, deixaram uma importante contribuição para a sociedade.
no século XX aparece a biografia romanceada, na qual o autor recria, ficcionalmente, o material documental e de pesquisa coletado sobre a vida dos biografados.
quando o biografado é o próprio autor, temos a autobiografia, que vem a ser a biografia escrita pela pessoa de quem a biografia fala, ou seja, o autor procede ao levantamento de sua própria existência.
A Coleção Aplauso, da Imprensa Oficial do Estado, que tem como objetivo resgatar a memória da classe artística brasileira, selecionou como autores jornalistas. As autobiografias da coleção são relatos na 1ª pessoa.
muitas pessoas conhecidas do grande público (as ditas celebridades) que desejam fazer uma autobiografia, mas não tem habilidade literária, utilizam-se de um profissional ghostwriter (traduzindo, literalmente, escritor fantasma) que escreve a biografia em tom autobiográfico de modo que a autoria passa a ser alegadamente da pessoa biografada.


OBJETIVOS DAS BIOGRAFIAS - Estimular as pessoas que gostam de leitura e literatura a reabilitar, resgatar, documentar, enfim, por meio da narrativa oral e da escrita, a trajetória de vida de um parente mais velho, um amigo especial, um mestre, partindo do princípio de que o universo íntimo de cada pessoa e sua trajetória de vida são especiais para quem com ela conviveu.

A biografia pode resultar em um caderno único ou um álbum ilustrado, em algumas ou muitas cópias em xérox do material ou até mesmo na edição de um livro ilustrado a ser repassado para futuras gerações.

COMO TRABALHAR
· Roteiro
· Pesquisas – situar a ação – data- bairro – cidade – amigos – escola – ruas da infância etc
· Entrevistas
· Duração das conversas

AUTORIZAÇÃO
No caso da imagem, a utilização prescinde de autorização, desde que não tenha caráter comercial e a pessoa famosa não seja retratada em momento de intimidade.
Quanto à intimidade das pessoas célebres, os limites decorrem do interesse público (que também limita o direito à honra) e das exigências de ordem histórica, científica, cultural e artística.
A biografia de Roberto Carlos foi escrita pelo historiador - e apaixonado por música brasileira - Paulo César de Araújo, mas não havia sido autorizada e não agradou ao cantor que, menos de dez dias depois do lançamento, processou o autor e a editora. Uma audiência de conciliação selou um acordo entre as partes mas o livro teve sua edição e venda proibidas e foi recolhido em todo o País. Segundo a Editora Planeta, desde sua publicação, foram impressos 33 mil exemplares do livro. Destes, 22 mil já haviam sido vendidos e os 11 mil que ainda estavam no estoque da editora foram entregues a Roberto Carlos.
Roberto Carlos alegava que sua biografia não tinha sido autorizada e continha inverdades que ofendiam a ele e a pessoas queridas, expostas ao ridículo. “É um absurdo, uma falta de respeito lançar mão da minha história, que é um patrimônio meu. Me sinto agredido na minha privacidade”.
As pessoas que eram a favor da biografia sugeriam que a história de RC também faz parte da cultura brasileira.
Os contrários alegavam que, apesar de ser uma pessoa publica, RC tinha o direito de preservar sua intimidade.
É importante notar que as pessoas famosas, que fazem parte de nossa história política, científica, cultural ou artística, têm uma diminuição significativa no grau de proteção de sua imagem e intimidade.

NARRADOR
· A biografia pode ser escrita na 1ª ou 3ª pessoa.
· Na 1ª pessoa – autobiografia- o narrador pode atuar como protagonista da historia ou um personagem lateral que fica observando. A narrativa na 1ª pessoa dá verossimilhança. É um depoimento confiável, mas limita o campo de visão, não dá para iluminar a historia por outros ângulos.
· A biografia na 3ª pessoa é a forma mais freqüente.
· O narrador na 2a pessoa – tu, você- é raro.

FESTA DOS GATOS

Rosi Caobianco
Exercícios a partir da frase: Era uma vez um gato xadrez...

FESTA DOS GATOS

Gato xadrez
Gato malhado
Gato preto
Gato gordo
Gato magro
Gato escocês

Vira e mexe o gato da vez sai.
Vai e volta para o reduto de Marinês.
Gorda, forte, viúva e filha de marquês.
Marinês vira uma fera quando os bichanos retornam estropiados da farra do mês.
Gemem de dor e de satisfação de mais uma escapadela para o coito das três.Na casa da gata do mestre camponês.
De todos, o mais estúpido é o gato xadrez.
Sua ingenuidade o deixa cada vez mais com menos espertez.
Sem malícia sempre perde a vez.

ERA UMA VEZ UM GATO XADREZ

Em um bairro muito distante, havia um gato um tanto quanto diferente.
Desengonçado e engraçado, o gato chamava-se TEO. Cautelosamente. ele circulava pela praça dos gatos em frente à sua casa. Todos o achavam repugnante e esquisito. Tinha uma aparência um tanto quanto desengonçada.
TEO era discriminado por ser diferente. Chamava a atenção por sua pelagem xadrez. Além de tudo, achavam que rebolava ao andar e miava de modo estranho.
RAMBO, o gato fortão, olhava-o desconfiado pelo canto do olho e pensava: - Se este gato se aproximar mais um pouco lhe dou uma surra.
Geralmente, passavam pela praça todos os gatos da vizinhança.
Certo dia, os gatos machões das redondezas resolveram que fariam um boicote contra TEO. Marcaram para o dia seguinte um confronto. Enfileirados, de cara amarrada, ficaram a espera de TEO.
Assim que TEO apareceu, todos ao mesmo tempo deram alguns passos à frente, franziram as sobrancelhas e miaram o mais forte e grosso que puderam.
TEO, morrendo de medo, saiu em disparada, desengonçadamente. Colocou o rabo entre as e correu dali o mais rápido que pode.
RAMBO, o líder, sentiu-se vitorioso e falou:
- Acho que esta coisa xadrez não vai aparecer mais por aqui.
E festejaram o sucesso da investida contra TEO.
Daquele dia em diante TEO não passava do portão de sua casa. Vivia enclausurado dentro do próprio quintal.
Alguns meses mais tarde, soube-se que depois daquele episódio na praça, TEO, de tanta tristeza, caiu em depressão e morreu logo depois, sem amigos. Não aguentou tamanha desilusão.
Os gatos machões souberam pelos vizinhos da morte de TEO e alguém comentou sua triste história. TEO. quando era filhotinho, havia sido atropelado e ficado com seqüelas.
Julgaram-no sem conhecê-lo. Nem deram oportunidade de mostrar o quanto era legal.
Portanto, nunca julgue sem saber da verdadeira razão. A realidade pode ser outra .E perde-se a oportunidade de conhecer alguém, como quem sabe, seu melhor amigo.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Exercícios a partir da palavra carrapicho

Rosi Caobiano

SINISTRO CARRAPICHO

Ai que saudades! ...
Grudados como carrapichos, abraçaram-se com intensidade.
Nem poderiam imaginar que em cinco minutos estariam separados novamente.
Ouviu-se um estampido.
Sem mais nem menos, estavam ali.
Estirados ao chão.

VOLÚPIA DO CARRAPICHO

Pequeninos, porém maliciosos.
Atracam-se com qualquer um,
Então, lá vai ele novamente.

CARRAPICHO SELVAGEM

Cavalgando entre as matas, sigo pensativa. Aprecio cada detalhe. Até os carrapichos silvestres aconchegam-se a mim como se quisessem seguir ao meu lado. Mostro-me receptiva ao que me é oferecido e ofertado. Aproveito tudo como bênçãos recebidas.
Que beleza!
Nada deixo de observar e sentir. Até os pernilongos não excomungo. Fazem parte dali. Cabe a mim, dominá-los e espantá-los. Sigo em frente, o melhor ainda está por vir, tenho certeza.
Que beleza!
Busco mais, sei que a felicidade está na somatória dos pequenos prazeres. Com momentos de êxtase preencho mais uma página em meu repertório de vida.
Observo as borboletas que voam livremente. Suas cores, sua desenvoltura em desfilar.
Os carrapichos pequeninos seguem firme comigo, agarrados para não perder esta carona. Também querem apreciar cada detalhe de seu habitat.
Que beleza!
Céu azul, árvores frondosas, cachoeiras gritam sua presença. Interagem em sinergia com todo o universo. Fazem-se presentes e de um jeito simples, pedem respeito. Preservem.
Que beleza!
Ao retornar, deixo ali, meus amigos carrapichos.
Solto-os na terra molhada pelas chuvas para germinar e crescer. Deles, virão outros e deste modo, o ciclo continua.
Que beleza!
Salvem a natureza!

O Mestre que Amava

O Mestre que Amava
“Drummond”

Valéria Ribeiro
Exercício a partir da palavra POMPOM

O professor de administração era um homem culto, além de muito elegante, mas um dos seus melhores atributos era amar a poesia de Carlos Drummond de Andrade.

Ele sempre chegava na classe, colocava a chave do seu carro em cima da mesa e antes de começar a matéria pertinente à disciplina de administração, lia. ou melhor, recitava Drummond:

“ Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um individuo genial.

Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui pra diante vai ser diferente”.

Dizia que era um estímulo a vida do cotidiano, pois um administrador, muitas vezes é obrigado a lidar com a rotina do trabalho e com a frieza dos números, mas perto de Drummond, com certeza, todos encontrariam um objetivo maior do que a limitação da burocracia.

Eu adorava esse professor, até que um dia algo me intrigou: ele chegou para ministrar sua aula e a chave do seu carro estava com um chaveiro de POMPOM. Era um chaveiro indiscreto, o pompom era enorme na cor verde alaranjado, destoava daquele professor tão refinado. Confesso que neste dia não consegui prestar atenção na poesia que foi recitada, pois meus pensamentos ficaram presos ao chaveiro de pompom.

Passados um mês dessa aula de estréia com o chaveiro de pompom, eu não resisti, precisava perguntar ao nobre mestre a razão da existência desse pompom. Qual seria a mensagem para nós, futuros administradores? Entretanto, como não tinha coragem de abordá-lo para fazer uma pergunta tão abusiva, resolvi furtar o pompom para posteriormente entregá-lo, como uma pessoa de alma boa que devolve o objeto perdido do mestre querido.

E assim fiz, discretamente, ao final da aula, quando todos os alunos rodeiam o professor para fazerem as mesmas perguntas que já foram respondidas na aula. Aproveitei a distração de todos e surrupiei o chaveiro de pompom, deixando a chave jogada na mesa.

Na próxima aula, assim que o meu mestre querido entrou na sala, eu me aproximei e ansiosamente falei:

- Professor! Tenho uma boa notícia! Achei o seu chaveiro de pompom, estava no chão, ele deve ter um significado para o senhor?

- Sim, ele impede que eu esqueça a chave do carro, por ser tão grande e esquisito, mas muito obrigado.

Depois disso percebi que até os mais inteligentes têm atitudes comuns, mas, no meu caso , tive uma atitude alucinada e medíocre. Como pude furtar o pompom, como pude perder a atenção nas aulas, por causa do pompom? Acho que essa é a nossa diferença, ele se preocupa com a mensagem de Drummond e eu com a mensagem do pompom.

E para a minha surpresa, nesta aula eu entendi porque o professor amava Drummond:

“ Era o início da tua melhora...
Onde você quer chegar? Ir alto?
Sonhe alto... Queira o melhor do melhor...
Se pensarmos pequeno... Coisas pequenas teremos...
Mas se desejarmos fortemente o melhor e, principalmente, lutarmos pelo melhor...
O melhor vai se instalar em nossa vida
Porque sou do tamanho daquilo que vejo, e não do tamanho da minha altura”

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Exercício com palavras

Antonio Taveira

Exercício com as palavras

Xaxim
Amêndoa
Apocalipse
Arrasta – pé
Jabuticaba
Mágoas
Pêndulo
Trevas
Vingança

- Pru causo de quê? – Pergunto Nhô Laudelino.

A festa corria solta. O povoado compareceu todo, afinal, era a festa mais popular da região. Os mais velhos sentados às mesas, degustando os quitutes deliciosos que as barraquinhas se esmeravam em oferecer. Principalmente a torta de AMÊNDOA que Dona Cotinha fazia com todo carinho. Os jovens faziam um ARRASTA-PÉ improvisado no chão de terra batida, ao som do Grupo de Forró do Lobão, e as crianças corriam e brincavam com estalinhos e outras traquinagens. A decoração estava muito bonita como sempre. As bandeirolas cortando todo o espaço da grande barraca de lona, e as bromélias presas aos tuchos de XAXIM, davam uma agradável sensação àquele espaço. E no canto, alheio à toda agitação, aquele grupo de homens bebericava um licor de JABUTICABA e proseava.

- POCALIPSE! – Profético, respondeu Nhô Bento! Todos curvaram-se para a frente para ouvir melhor, seus olhos pareciam que saltariam do rosto.
- Ara , Nhô Bento, que troço é isso? - Emendou Ditinho.
- É o fim dus tempo, continuou Nhô Bento. Todos sabiam que quando o Coroné chegasse lá, sua VINGANÇA, tornaria aquela fazenda que tinha o nome de Santa Gertrudes em TREVAS.
- Conte logo tudo isso. - Apressou Nhô Laudelino.
- Carma sô! As mininas gêmias, filhas do Coroné, sempre foram muito espevitadas e arteras, também pudera, o trabaio que dero pra nasce, levaram sua mãe pra junto di Deus, e dexaro o Coroné criando elas suzinho, além di cuida de toda aquelas terras que pareciam num te fim.
- Tudo começô, quando chegaro aqueles dois peão que vinheram da cidade, e foram trabaiá na fazenda. As mininas, já não tão mininas assim, conheceram os moço e garraram a ouvir suas história da cidade grande.
- Cumpadi! Bote mais um poquinho desse licor que já to cá garganta seca.
- Co essas história, as mininas foram ficando cas cabeça cheias das idéias, di ír pra conhece a tar da cidade grande. Mas vixi que o Coroné ia dexá. Queria as filha bem pertinho dele, e nenhum cabra safado cercano suas querida.
- Mas as mininas foram criando a idéia di fugi cos peão. Prepararo a viage pra uns dias dispois à noite. Iam pra estação, pegá o trem noturno pra capitar.
- O Coroné, continuou, naquela noite, tava se sentindo meio isquisito. Sento na sala e tava tomano uma cachacinha. Com sodade de sua muié, fico prestano atenção no vai e vem do PÊNDULO que tinha no carrilhão di casa, e cabo dormecendo. Cordô di madrugada, e foi vê se as mininas tava drumindo. No quarto as cama tava rumadas e nada delas. Prucura daque prucura dali, preguntô pra todo mundo, e ninguém sabia di nada. Chamo toda peãozada, quando percebeu que os novo peão, também num tavam.
- Descunjuro esses dois se tivero feito arguma coisa cas minhas mininas!
- Botô na caminhonete seus miores home, e foi pra vila, onde fico sabeno que elas tinha pego o trem.
A atenção dos homens estava em Nhô Bento, além da sua voz, parecia que não nada tinham em seu redor. Uma rodada mais de licor foi servida, e ele continuou.

- No caminho pra Capitar, o Coroné ia pensano, pru quê elas tinha feito aquilo? Deve di te sido coisa daqueles dois, num tinha ido muito co jeito deles, mas fôro mandado pelo cumpadi Venâncio, num diviam di se ruim. MAGOADO, foi pensano e alembro qui as minina pediro pra modi vir visita a capitar, mas não dexo, i agora tava rependido.
- Prá sorte du Coroné, numa cidadi du caminho, o trem demoro pra carrega di água e chego trasado, e ele assim qui botoô os pé na istação, viram as mininas saindo do trem cos peão.
- As mininas quando viro o pai, começaro a treme qui nem vara verde, e ele falo:
- Mias fia, quero pedi discurpa por nunca ter trazido oces pra cá, e vamu aproveita qui tamo aqui pra passiá. As mininas deram um largo sorriso e correram abraça o pai.
- Dispois o Coroné virou prus seus home e disse: Leva esses dois, dá uma coça bem dada, e joga eles em quarque lugar e voltem pra fazenda, eu vô fica aqui cás minina.
- Os dois, concluiu Nhô Bento, dizem que ficaro um mês sem pode senta e nem durmi di costa, ca coça qui levaro.

As cabeças dos ouvintes fizeram um movimento de aprovação ao castigo dado.

Ao fundo um acordeão “cantava”:
Quando olhei a terra ardendo, qual fogueira de São João...