quinta-feira, 12 de novembro de 2009

SOLIDÃO

Antonio Taveira

Nunca ouvi um Bom dia! Boa tarde! Ou Boa noite! Tinha sempre uma frase, uma história, um acontecimento.
─ Olá Mário, bom dia.
─ Rapaz, tava até agora na Receita Federal, só atendem quinta-feira, tenho que chegar às sete horas e pegar uma senha, depois esperar até ser atendido.
Se estava chovendo, falava da chuva; se estava sol, era o motivo do papo. Por mais cedo que chegasse ao prédio, a porta de ferro já estava aberta ─ O Mário já chegou! Encontrava-o conversando com o senhor da banca. No bar da esquina, tomava uma cervejinha no final do dia. Mas não era exclusivo deste. Variava sempre, cada hora em algum barzinho diferente, sempre sorrindo e contando “causos” e jogando conversa fora. Mas o bar não era seu cotidiano não. Conversava com o Chico do açougue, com o Zé do laticínio, com os motoristas de táxi do ponto da Senador. Era eclético, falava com todo mundo e sobre qualquer assunto. O sorriso fácil sempre estava em seu rosto. Seu escritório de contabilidade, imagino, lhe permitia uma vida financeira tranqüila complementando a aposentadoria. Por isso, quando o vizinho me mostrou o obituário, não acreditei:

─ O Mário não! Não pode ser. Uma pessoa como ele não poderia tomar uma atitude desta.
─ Parece que ele havia tentado antes. Depois da separação, ficou muito sozinho, os filhos, tinha um casal, não o procuraram mais. Proibiram-no até de ver o neto, companheiro para o jogos do Jabaquara e Portuguesinha. Eu o via trazendo uma quentinha para comer só, no escritório. Apesar de falante, sorridente, conversando com muita gente, era uma pessoa triste. Na hora do acidente, o maquinista até o viu, mas parar uma locomotiva em movimento não é uma tarefa de poucos metros.
Até hoje custo a acreditar, mas a solidão é um sentimento poderoso que leva as pessoas a cometer atos insanos como este do Mário.

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