segunda-feira, 19 de outubro de 2009

FAZ DE CONTA

Viviane de Almeida

Vamos brincar? De que? De faz de conta. Faz de conta, sabe? Você imagina que eu sou e eu deixo você imaginar. Nunca? Não acredito que você nunca brincou desse jeito. Quer experimentar? Sei, tem medo. Eu vou aos poucos.... e podemos parar quando você quiser.

Começamos com o tempo. Faz de conta que o tempo parou. Faz de conta que o meu cabelo é vermelho.

Falsa ou natural? Provavelmente você não saberia fazer essa distinção. O que é bom, porque a minha única alternativa é fingir que sou

Quer que eu faça de conta que sou ela? Eu faço. Não é difícil e por você faria qualquer coisa. Ficou triste? Falei alguma coisa errada? Já sei. Ela é insubstituível. Desculpe, só queria ajudar.

Tudo bem, eu entendo. Conhece as regras do jogo. Se quiser parar, é só levantar a mão.

Fala, eu não me importo. Estou acostumada. E os olhos, azuis ou verdes? Parecidos com os meus? Levemente, você diz. Então deveriam ser verdes. A luz do abajur engana. Disfarça.

Conheciam-se há muito tempo? Uma vida inteira? Que bonito. Ninguém hoje vive mais para sempre. Eu? Não quero falar sobre isso. Estou aqui para fingir.

Sente muito sua falta? Saudade é difícil, mesmo. E as mãos, como eram? Pequenas, delicadas. Aposto que eram pequenas. Assim, como de uma criança. Como eu sei? Observo as pessoas.

Sente falta dos dedos de fada dela. Pequenos. Redondos. Dispostos.

Quer ver eu acertar de novo? Não gostava de maquiagem. Tinha sempre a cara limpa. Está surpreso? Não fique.

Eu só observo as pessoas.

Era esse o nome dela. Bonito. Nome de princesa. Não chore. Eu entendo.

Vamos fingir que a minha mão é pequena. Estou tirando a maquiagem, espere um minuto.

Minhas mãos são pequenas, não uso maquiagem. Meu cabelo é ruivo e estão levemente presos com a presilha de pedras e flores que você trouxe. Não era desse lado que ela usava. Quer colocar?

Passe-me o espelho. Que colar lindo. São pérolas? Verdadeiras? Engraçado... Assim, quando vejo minha imagem refletida, minhas mãos parece que encolheram.

Quer que eu tire o esmalte? Isso não posso. A sua hora já terminou.

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